segunda-feira, 17 de junho de 2013


O  PIOLHO

 

 

            Apelido é uma coisa que pega!  E existem pessoas que são “experts”  em colocar apelidos. Basta chamar a primeira vez que pega!  Com o Jorginho foi assim. Lembra-se  que ainda na infância,  pegou  uma parasitose de piolho que  foi difícil  acabar. Sua mãe  gastou várias latas de Neocid e acabou tendo que raspar sua cabeça e sobrancelhas, já todas feridas de tanto coçar. Na hora do recreio,  na escola do primeiro grau, costumava  jogar futebol com a garotada. Alguém que não sabe quem, certo dia, quando ele pegou a bola e ficou sozinho   de frente para o gol, gritou bem alto -- chuta piolho! Pronto! Foi o suficiente para todo mundo passar a chamá-lo de piolho. E daquele dia em diante passou a sofrer de “bulling”  primeiro na escola, depois na rua da sua casa, no primeiro e segundo  graus, por onde andava, sempre  teve que conviver com esse apelido que detestava! Primeiramente adotou atitudes que sua mãe sugeriu, ou seja, tinha que ser indiferente.  Fazer que não estava nem aí!  Quando lhe chamassem por esse apelido, não devia atender! Não deu certo. Ficava incomodado. Depois passou a pedir amigavelmente que lhe chamassem pelo nome: JORGINHO. Mas não adiantava, sempre  era piolho pra cá, piolho pra lá.  Já adulto, passou a freqüentar a academia e a praticar judô. Levantou  muito peso, puxou muito ferro, deu muito traço nos adversários  em cima do tablado! Ficou “bombado” com músculos  volumosos, que exibiam veias  azuladas, grossas e tortuosas sob a pele. Pensou, e chegou a conclusão de que ia acabar com aquele maldito apelido por bem ou por mal!  Avisou a todos que não aceitava mais aquele apelido. Tinha sido coisa do passado, quando ainda era criança! Agora era outra fase de sua vida. Era um rapaz do bem, desportista, chegara até a faixa preta do judô! Tinha namorada, amigos e amigas. Seus pais também não gostavam daquela  maldita  alcunha! Dava a impressão que era  sujo, que estava sempre parasitado pelos ftirápteros. Aos poucos o apelido foi desaparecendo nos meios que mais freqüentava: o clube e a academia de judô.  Certo dia, já  andava até meio esquecido desse apelido, quando chegou  ao Clube  num domingo para nadar um poço na piscina. Era também um bom nadador, fazia com facilidade  dez  voltas indo e vindo na piscina semi-olimpica. Quando  estava  começando  seu alongamento para cair n’agua, eis que ouviu alguém gritando escandalosamente, do outro lado do complexo aquático:

-- Piolho! Tenho certeza que é você!  Olha pra mim piolho!                                                           

    No início, ficou estático, fez de conta que não era com ele!  Mas, aquela voz irritante, remeteu-lhe  ao antigo “bulling” da escola:

-- Piolho, é teu colega do “ Classe A” o Alfredinho! Pensava que eu não ia te reconhecer, né?  Olha pra mim piolho!  A galera toda que estava na piscina e também nas outras quadras de esportes, parou! Ficou aquele silêncio!  Não tinha outro jeito. Virou a cabeça e encarou o tal Alfredinho.  Era ele mesmo! Baixinho, entroncado, com um cavanhaque bem fino e uma cara de eterno gozador que o fazia  parecer sempre sorrindo da desgraça de alguém! Respirou fundo e sem alongamento caiu na piscina. Foi até a outra borda e voltou! Parou, sentou-se na borda da piscina achando que aquele idiota o tinha esquecido!... Mas, agora, ainda mais perto do seu ouvido, o gritou outra vez:

--Piolho, seu ingrato! Tu não me conhece mais?  Mas eu te conheço ainda e muito bem! Tu és o piolho! Não vai me enganar com essa musculatura toda! Agora tu és o piolho “bombado”!  E aquela risada parece que  ecoou em todo o Clube. Todos continuavam olhando para aquela cena com a qual ele já até nem estava mais acostumado.  Falou:

-- Não me chame mais pelo apelido! Aquilo foi coisa do passado!  Meu nome é Jorge!

-- Jorge coisa nenhuma, cara! Tu é o piolho e vai ser o piolho de sempre!  Ouviu algumas  risadas em volta deles.

-- Pare com isso! Eu conheço você, mas por  favor me chame pelo meu nome. Não gosto de ser chamado por esse apelido!

-- Porque isso agora, cara? Só porque ficou fortão? Mas pra mim tu continua sendo o P-I-O-L-H O!

    Jorge levantou-se, aproximou-se do tal Alfredinho e disse-lhe  quase  sussurrando:

-- Se você não parar com esse apelido, vou bater em você!

-- Que é isso, rapaz! Agora a violência?! Vem  me  ameaçar só por causa de um piolho?! E dobrou aquela gargalhada!

     Jorge então primeiro deu-lhe um empurão que o fez cair na pedra quente de ardósia na pérgola da piscina. Todos que estavam por perto se levantaram!  Pairou no ar o suspense  que antecede o chamado “ vias- de- fato “!  Deu um golpe em seu braço, um soco na altura do estômago e o atirou na na parte funda da piscina! Antes que alguém chamasse o segurança, o Jorginho deu-lhe as costas, pegou sua toalha e foi saindo calmamente.  Já lá na frente, ouviu muitas risadas e então resolveu olhar para trás. O que viu quase o matou de ódio e cólera: o Alfredinho, ainda mergulhado na piscina, com os dois braços  levantados  para fora d’água, fazia um gesto de esmagar alguma coisa  minúscula  entre as unhas de seus polegares!...

                                                                                                                           PVH-RO, 13/06/13

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