BÊBADOS & BÊBADOS
Samuel Castiel Jr.
Todo bêbado tem um santo forte. Confesso que
depois de ver tantas e boas, passei a
acreditar nisso. Dizem que as crianças também tem. Mas a verdade é que o santo
dos bêbados, com muito mais frequência, dá prova dessa proteção. Existem vários
tipos e subtipos de bêbados, desde o pinguço pé inchado até o mais sofisticado,
que só bebe whisky importado. Mas, seja qual for a bebida, o bêbado é sempre o
mesmo. O que sente sono, debruça-se e dorme na mesa ou se levanta e vai dormir
no sofá de sua casa. O que vira “mala”, não para de falar e não deixa ninguém
falar; o que fica pegajoso, puxando o nosso braço ou cutucando as nossas
costelas; o que não quer pagar a conta, confere e reconfere a conta, chama o
garçon e o dono do boteco de ladrão. Existe o que fica rico, vira o dono do
mundo. Mas existe também o que só conta miséria, que tá desempregado. O machão,
mulherengo, “papa-anjo” e pegador, e aquele que é pobre diabo, tímido, que não dá sorte pra mulher, tendo que beber muito pra tentar pegar alguém. Aquele que
fica bravo, grita e quer brigar com todo mundo; aquele que diz que é corno
convencido e aquele que é corno ciumento, que mata os dois se pegar. E ainda tem
aquele que se desmunheca todo quando toma umas!...
Abel Matrero, mais conhecido como
Belzinho do Gole, pode se dizer que seria enquadrado como um bêbado engraçado.
Mudou-se para num condomínio e, depois
de algum tempo, quando voltava a noite pra casa, “travado”, passou a ter uns
lapsos de memória e não conseguia mais acertar a sua casa. Até porque todas as
casas eram iguais! Mas, orgulhoso, dizia sempre que bebia bem e tinha sorte! Na
realidade, o seu santo é que era forte! Quando voltava pra casa, a noite, já
tinha passado no bar onde jogava conversa fora com a “galera” e tomado alguns muitos
whiskys. Algumas vezes já acontecera de ter errado o caminho da sua casa e
dormido em posto de gasolina, dentro do carro. Mas, sempre aparecia um anjo da
guarda que o protegia e o levava para casa. Agora, porém, com a Lei Sêca, a
coisa estava mais difícil. Podia cair numa Blitz e até ser preso, perder a
carteira de habilitação e ainda ter que pagar multa. Por isso, preferia pegar
um taxi quando saía pra beber, pois ficava mais a vontade e era mais seguro. Acontece
que, nesse dia, o Belzinho do Gole exagerou. Tomou todas e, naquela sexta-feira
já estava mal intencionado, quando deixou o seu carro no estacionamento do
banco onde trabalhava, pegou um taxi e saiu para o “happy hour”. Bebeu whisky,
vodka e cerveja, misturou tudo e no final já estava bebendo pinga e
conhaque. Quando o dia começou a clarear, lembrou-se que precisava voltar pra
casa. Pegou o primeiro taxi que passou e quase não acertou dizer para o taxista
o seu endereço. Quando o taxi fez uma curva fechada, já quase chegando a sua
casa, o Belzinho não aguentou e vomitou dentro do taxi, sujando tudo que estava
a sua frente, inclusive o taxista, que imediatamente parou o carro e pegando
uma chave de roda, expulsou o Belzinho ameaçando quebrá-lo todo, se ele
resistisse. Aos tropeços, saiu do carro, deixando cair do seu bolso algumas
notas e moedas na tentativa de pagar a corrida.
-- “Vaza” do meu carro, seu filho da
puta! Vou te deixar na sarjeta que é o teu lugar!
Belzinho entrou cambaleando no
condomínio e bateu na porta da casa. Quem veio abrir a porta não foi a sua
mulher e sim uma senhora gorda com a cabeça cheia de bobes.
-- O senhor me desculpe mas essa não
é a sua casa!
O Belzinho que estava se escorando
na coluna, falou alguma coisa parecida com desculpa e saiu aos tropeços. Deu a
volta completa no condomínio e bateu na mesma porta:
-- O senhor de novo?! Já lhe falei
que essa não é a sua casa – disse-lhe a mulher dos bobes, extremamente mal
humorada.
Outra vez cambaleando o Belzinho sai
e dá mais uma volta no condomínio, batendo outra vez na mesma porta:
-- Agora já é demais! Minha paciência
esgotou! Vou chamar a polícia –diz quase gritando a mulher dos bobes.
-- Ah é?! Pois pode chamar a polícia
e quem mais a senhora quiser, e eu vou falar pro seu marido que a senhora tá em
todas as casas que eu bato!...
Belzinho foi resgatado pela Marilu,
empregada de sua casa, uma nega baiana que chegava cedinho naquele sábado para
mais um dia de trabalho e, vendo a situação que o seu patrão se encontava, o
chamou:
-- Seu Abel vamos embora que eu levo
o senhor pra sua casa.
-- Tá bom, tá bom Neguinha. Mas tu
vais na frente e esconde facas, tesouras, vassouras e aquele rolo de amassar
massa de pastel... Faz de conta que hoje tu és o meu anjo da guarda, enviada
pelo Senhor do Bonfim.
E saiu agarrado na cintura da Marilu.
Já no meio da rua, colocando as duas mãos na boca como se fosse canalizar o
som, gritou para a mulher gorda dos bobes:
-- Bebo bem e tenho sorte!...
PVH-RO,
29/09/13
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